Pesquisas revelam tendências do mercado musical independente durante a pandemia – e o que você deve fazer nesse mercado em transformação

2019 foi um ano de destaque para artistas independentes, com receitas, fluxos e participações de mercado crescendo fortemente. Mas com a COVID-19 as perspectivas rapidamente se transformaram e o mercado de música teve de reaprender tudo rapidamente. Mas mesmo com todas as dificuldades, muitos artistas independentes encontraram novas oportunidades e a capacidade de inovar e criar.

A produção de música independente cresce no mundo todo

É o que diz a recente pesquisa MidiaResearch/Amuse realizada com 376 artistas em todo o mundo. Ela apresenta uma visão sobre o artista independente em 2020 e como ele navegou nos desafios colocados pela pandemia. As respostas da pesquisa foram coletadas ao longo de junho e julho de 2020, quando a maior parte do mundo estava em alguma forma de “bloqueio” imposto pelos governos. A grande maioria dos entrevistados é composta de artistas independentes, que lançam sem uma gravadora ou um selo.

  • Um setor com escala real. Artistas independentes “diretos” (ou seja, aqueles sem gravadoras ou selos) geraram U$873 milhões em 2019, 32% a mais em relação a 2018. Esses artistas independentes representam o segmento de crescimento mais rápido do negócio de música gravada global, um segmento de escala global com impacto e influência reais. Eles também são mais nativos de streaming do que artistas de gravadoras.
  • Sucesso nos próprios termos dos artistas. Cerca de 44% dos artistas desejam construir o sucesso online e de streaming ‘em seus próprios termos’, com menos de um em cada cinco artistas considerando importante assinar com uma gravadora.
  • Lockdown foi visto como uma janela criativa única pelos artistas. Quase 70% dos artistas aproveitaram a oportunidade da quarentena para passar mais tempo escrevendo ou fazendo música, e mais 57% criou mais conteúdo para as redes sociais. 
  • Colaboração: 36% dos artistas independentes relataram trabalhar mais em colaborações durante a quarentena do que antes. A música está se tornando um empreendimento mais colaborativo do que nunca e todo um ecossistema de ferramentas e serviços digitais está emergindo para atender à crescente demanda dos artistas, fornecendo um processo mais estruturado e em rede do que muitas gravadoras podem. Plataformas como Splice, BandLab e Loopcloud fornecem públicos globais e vários modelos de remuneração para produtores. Muitos artistas estão começando a ver o lançamento de sound packs/samples simplesmente como outro formato de lançamento. Plataformas como SoundBetter da Spotify e LANDR Network oferecem mercados para os criadores venderem sua criatividade. Quer você seja um compositor, produtor, músico ou vocalista, essas plataformas podem fornecer uma forma adicional valiosa de monetizar a criatividade e as habilidades. Portanto, uma consequência não intencional da quarentena é que ela obrigou mais artistas a explorar maneiras de fazer colaboração remota e muitos desses novos comportamentos aprendidos vão persistir além da pandemia. Uma nova forma de fazer música está nascendo.
  • Os artistas reagiram à quarentena de maneira diferente. Em termos de lançamento de música, os artistas se dividiram – com 46% lançando mais música, mas 40% colocando projetos em espera. Embora quase 30% dos artistas estejam agora mais preocupados com as finanças do que antes, uma proporção semelhante não está muito preocupada e acha que a vida voltará ao normal em breve.
  • Lockdown destacou a economia de streaming. Metade dos artistas está começando a se preocupar com o fato de que os serviços de streaming não estão pagando o suficiente para que os artistas ganhem a vida. Apenas um em cada cinco artistas se envolveu em apresentações ao vivo.
  • Dinheiro, dinheiro, dinheiro ainda ilusório. A maioria dos artistas independentes ganha menos de U$10.000 por ano com a música, mas a receita pode crescer para mais de U$100.000. Isso se deve em parte à enorme escala dos artistas que fazem (e distribuem) música, mas também ilustra como é difícil ganhar a vida sendo um artista na indústria de hoje. O uso de plataformas de crowdfunding permanece baixo e os artistas ainda têm poucas opções de financiamento para que o setor direto realmente floresça. (Aqui um artigo com diferentes possibilidades de monetização para músicos independentes, incluindo redes sociais, transmissões ao vivo pagas, produtos virtuais com a marca do artista monetizada em jogos e outras plataformas digitais, plataformas de colaboração musical, e monetização do fandom).
  • Os artistas precisam trabalhar com vários fluxos de receita para construir um impulso na carreira. A chave para os artistas de hoje é obter receitas de várias fontes, como publishing, ensino de música, sessions, patrocínio e merchand, além de streaming e shows. Os artistas são pequenos empresários. Eles precisam de quatro ou cinco fontes de renda para decolar.
  • O marketing é uma questão de “Do it Yourself”. Metade de todos os artistas independentes faz seu próprio marketing, com um terço gerenciando seu próprio orçamento de marketing, mas 40% dos artistas independentes não gastam nada em marketing. Menos de um em cada cinco dentre eles está trabalhando com um distribuidor ou gravadora em atividades de marketing. O artista independente deve saber que marketing é pesquisa, experimentação e persistência e é ainda mais importante para artistas independentes que não possuem gravadoras para fazer esse trabalho por eles.
  • Os artistas são autossuficientes, mas ainda inexperientes em marketing. Pelo menos quando se trata de iniciar suas carreiras, os artistas estão fazendo seu próprio marketing DIY, mas não estão aproveitando ao máximo as ferramentas disponíveis. Embora quase dois terços dos artistas estejam usando o Spotify For Artists, poucos deles estão usando qualquer outra ferramenta relacionada ao marketing. 

Fazer e comercializar música está ficando mais fácil e mais difícil ao mesmo tempo

Mais fácil porque os artistas podem estar no controle: lançando música quando você quiser, crescendo e usando as mídias sociais, procurando colaboradores e patrocinadores de artistas com interesses semelhantes, não tendo que depender de investidores. Mais fácil também porque os artistas podem se tornar globais desde o início.

Por outro lado, o caminho para uma carreira é mais longo e provavelmente nunca termina. A distância entre o artista e o fã, o criador e o consumidor está diminuindo, e exigindo relações mais autênticas.

Além disso, os fabricantes de equipamentos estão tendo um ano de boom e uma das muitas coisas que as pessoas têm feito com mais tempo disponível é satisfazer suas paixões. Então, para aspirantes a artistas independentes, uma nova onda de competição chegou na forma de amadores talentosos, armados com as ferramentas e o tempo para fazer seu próprio entretenimento.

Baixe a pesquisa completa aqui.

Por outro lado, o consumo de música continua concentrado

A pesquisa Alpha Data publicada na Rolling Stone de setembro de 2020 apontou que mais de 90% das audições totais são de músicas de 1% dos artistas. A pesquisa mapeou os lançamentos nos principais serviços streaming de janeiro de 2019 a julho de 2020. Foram 1,6 milhões de artistas que lançaram faixas ouvidas 293,8 bilhões de vezes.

Consumo

Já a pesquisa brasileira “Futuro remasterizado: novos hábitos no consumo de música” da agência Flow, feita com 600 jovens de onze estados brasileiros, mostra outras tendências. 71,5% dos entrevistados escolhe a música pelo mood (estado de espírito) e não pelo gênero musical ou artista. A pesquisa aponta ainda o resgate de músicas que fazem parte da memória afetiva do consumidor, que o conecte com seus valores mais antigos e que trazem familiaridade e conforto ao consumidor em uma época de incertezas. O consumo de álbuns completos e do catálogo de artistas já conhecidos teve um aumento durante a quarentena, assim como de gêneros musicais mais antigos.

Esses valores serão revisitados ainda mais em um momento pós-pandemia. 67% prefere ver shows em formato mais intimista com artistas mais próximos do público e para poucos convidados. Lugares menores, aconchegantes e intimistas trazem não só segurança, mas a sensação de confiança e cuidado que resgatam os conceitos pré era digital.

Cultura

A necessidade de ambientes que trouxessem mais proximidade com o artista foram além dos eventos. A busca do consumidor pela transparência e pela proximidade entre artista – público é agora essencial.

Depois de anos trabalhando a imagem dos artistas como celebridades intocáveis, a indústria da música e do entretenimento, antes super “glamourizada”, se viu durante esse período com todos os seus valores sendo postos em cheque. A nova geração de consumidores valoriza a experiência compartilhada, o conhecimento dividido, os processos criativos abertos e co-criados. Produtores compartilhando suas telas, artistas conversando ao vivo com seu público, músicos abrindo seu processo de composição. Tudo de verdade, aberto e ao vivo. É o consumidor procurando por transparência e proximidade.

Novo senso de comunidade

A pesquisa indicou que um novo senso de comunidade vem se criando e a música é a voz que une todEs. Os artistas precisam se posicionar para ganhar a confiança e identificação dos consumidores que não estão mais preocupados só com a música, mas também com os princípios dos artistas como pessoas reais e não apenas personalidades imagéticas. A música deve ser coerente com as opiniões e ações que o artista se envolve. 55,6% diz que artistas que expõem e defendem sua opinião a respeito de seus valores e crenças chamam mais a minha atenção.

Ou seja, há um novo senso de comunidade, mais humana, engajada em que a neutralidade não tem lugar. O papel social dos artistas e das marcas agora é fundamental e o consumidor respeita aqueles que se posicionam a respeito de seus valores e crenças.

Conclusões: o que eu preciso fazer?

Seja pela necessidade de o artista fazer seu próprio marketing “Do it Yourself”, seja pela maior necessidade de transparência e co-criação entre artistas e seu público, é absolutamente necessário estabelecer relações autênticas tanto com com fãs como com consumidores esporádicos.

O princípio de “é só criar e eles virão”, de simplesmente fazer uma grande arte, não vale mais. Isso não é suficiente para levar a música até o público. Criar “conteúdo” em redes sociais, simplesmente, emulando o marketing de conteúdo que as marcas e suas equipes fazem, também não é capaz de engajar o público de maneira perene e fazê-lo consumir mais nas plataformas.

Sem conhecer os mecanismos que levam o público a reagir aos estímulos e aderir aos valores expressos na música, os esforços dos artistas independentes serão em vão. É necessário interpretar as reações do público para fomentar o engajamento de fãs e para monetizar o fandom além do consumo nas plataformas. Mais do que nunca, é necessário mudar as estratégias de engajamento de público, indo além da simples promoção da oferta através do marketing digital. É necessário entender a demanda para então planejar a oferta.

Para entender a demanda a Sonar indica dois cursos de Dani Ribas: Entenda seu Público (na On Stage Lab) e Estratégias de Carreira (no Music Rio Academy). Fique atento às datas.